domingo, dezembro 07, 2014

A linha invisível


Ao longo das várias viagens que realizei, dentro e fora de Portugal, denotei a existência de uma linha invisível, para lá da qual poucos turistas se aventuram.
Numa cidade como Istambul, destino turístico de importância mundial, onde residem mais de 14,5 milhões de habitantes, a linha é bem perceptível.
Acabo de entrar no metro de superfície no aeroporto Ataturk. Muitos do meus camaradas ocidentais não seguiram os meus passos, preferindo outros meios de transporte, tais como o transfer ou o táxi. Outros tinham alguém à sua espera com um tablet na mão - Mr. Asdrubal! Dead Mule Agency! - Longe vão os tempos do cartaz de cartão mal-amanhado, rabiscado em cima do joelho.
Ao longo do meu trajeto o número de caras pálidas mantem-se constante. Ninguém sai nem entra. Atravesso os subúrbios. Lá fora já está escuro como um prego e o trânsito de hora de ponta, como dita a regra, é caótico. Troco de linha. Vejo o ruído, as apitadelas, o caos, o fim do mundo. Sigo viagem.
O metro penetra na cidade muralhada! Os prédios altos e brutos dão lugar a pequenos edifícios de outros tempos, residência de pastelarias e restaurantes. A moldura humana transforma-se. Grande parte dos indígenas partiram deste território invadido por caras pálidas. Rebanhos de fiéis seguem o seu pastor de espátula na mão, receosos de perder o seu líder de vista e de se tornarem protagonistas de um filme de Hollywood- Rapto no Extremo Oriente.
Eminonu! Saio do metro! A azáfama continua. Na escuridão sobressaem os néons dos barcos de venda de peixe frito e dos restaurantes do piso inferior da ponte Galáta.
Dirijo-me a Yemi Camii( Mesquita Nova).  Nova mas só em espirito e em nome. Afasto-me, atravesso um bairro escuso, os meus camaradas ficam para trás, proibidos de andar a pé na penumbra. Não vejo vivalma.
Após alguns metros de lojas fechadas, de ruas pejadas de caixotes de papelão vazias, lembrando o mercado de Ourém, numa quinta-feira à tarde. Atinjo a luz.
Lojas abertas, cafés, restaurantes, barbeiros, internet café, supermercado da cadeia DIA. Há vida no outro lado da linha, mas rostos ocidentais nem vê-los. Nada nem ninguém me perturba ou assedia. Sigo o meu caminho e a vida continua com o seu dia-a-dia, sem uma única mulher à vista. Atinjo o meu objetivo! Hotel Karsioglu!
Na manhã seguinte, repito os passos do dia anterior. Algo está diferente. As ruas já não estão desertas, mas repletas de vendedores, é um autêntico centro comercial a céu aberto repleto de lojas, com todo o tipo de artigos, como por exemplo, uma especializada em cabides. Turistas nem vê-los, apesar de me encontrar a 500 metros de Eminonu, poucos se aventuram para lá da mesquita.
Vale a pena atravessar a linha invisível, pois lá no fundo pode estar a cidade pela qual os primeiros aventureiros se apaixonaram antes da chegada das massas. 

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