terça-feira, março 24, 2015

Adoro mercados! Ainda me recordo de ir com a minha mãe, com poucos anos de idade, ao mercado abastecedor de Almada. Ainda guardo na memória o cheiro a queijo seco  e a enchidos.
Sempre que posso vou ao mercado de Ourém, à quinta feira ou ao sábado. Gosto da variedade de padarias, de talhos, de bancas da fruta, vegetais, peixe fresco e sobretudo de rebuliço.

Os mercados são locais em risco, ameaçados pelas grandes superfícies comerciais, por novas rotinas e diferentes hábitos de consumo.
O grande contra dos mercados tradicionais, dirão algumas vozes, é o horário de funcionamento, pouco compatível com o ritmo frenético do dia e com o horário de trabalho da maioria da pessoas. Em algumas cidades, como por exemplo em Leiria, o mercado foi convertido numa galeria cultural e comercial, onde o único peixe à venda é o das pinturas de aguarela. Noutros locais, sofrem uma forte pressão imobiliária, como por exemplo, o Mercado do Bulhão no Porto, onde há muito se fala do interesse de se transformar aquele espaço num centro comercial.Mas não é só em Portugal que existem estas ideias brilhantes. Recordo-me da mobilização da população de um bairro em Budapeste contra o encerramento da sua praça em prol do desenvolvimento.
De modo a sobreviverem, alguns espaços adaptaram-se aos novos tempos, como por exemplo, o Mercado da Ribeira ou o Mercado de Campo de Ourique em Lisboa, conjugando o tradicional mercado de fruta, com restaurantes e bares.

Quando viajo procuro este locais, de modo a conhecer melhor os costumes e vivências locais assim como os produtos da região.

Babu Bazaar, Dhaka, Bangladesh


A cidade velha de Dhaka, junto ao rio, é pobre em dinheiro, mas rica, não só em história, mas também em vida e comércio. Nestas ruas estreitas encontra-se uma panóplia de pequenas lojas, de pequenas tascas, muito movimentadas. As ruas mais animadas são as do bazar hindu (Shakharibazar), onde autênticos encantadores de serpentes dos filmes, cozinham um saboroso caril de borrengo, enquanto no meio da rua desfila gente de todas as cores, do vermelho ao azul, a saltar, a cantar e a tocar.

                                                 Mercato di Mezo, Bolonha, Itália
Bolonha, uma das mais conhecidas cidades universitárias europeias, nas traseiras da Praça de Neptuno, bem no centro, encontra-se este mercado de rua. Apesar da chuva, os produtos da fértil região de Regio Emilia,o queijo parmesão e o presunto de Parma, são reis e senhores.

Harsicilar cd,Istambul, Turquia
                           
Nas traseiras do Bazar das Especiarias, pode-se encontrar de tudo um pouco, desde, café, locum, gomas, lençóis a  lojas especializadas em cabides.

 Ulu Çarşi, Bursa, Turquia
Um dos ex-libris da cidade de Bursa é o mercado da Seda. Não fosse sábado e dia feriado, estas ruas estariam cheias de vendedores com lenços de todas as cores.

Miçir Carşisi, Istambul (Turquia)
O mercado de especiarias é sobejamente conhecido pelas suas cores e odores, Hoje em dia um ponto obrigatório da cidade dos dois continentes, encontra-se um pouco descaracterizado. Não deixo de imaginar como seria no século XVII com poucos anos de existência.

 Mercado dos lavradores, Funchal, Portugal
Dois dos produtos de excelência da ilha da Madeira são reis neste mercado: flores e atum. Dita a regra que todas as excursões ao Funchal devem passar pelo mercado dos lavradores.  

 Grande Bazar, Istambul, Turquia
 É o maior mercado de Istambul, um autêntico centro comercial do império otomano. A sua dimensão intimida os rebanhos de turistas, que, com receio de se perderem neste labirinto de lojas, não  se aventuram muito para o seu interior.
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Mercato Centrale, Florença, Itália
A pouca distância da estação de comboio, este mercado é um bom local para conhecer os produtos da região, comer queijo, enchidos e beber uma bela vinhaça. Se a ideia for a de conhecer os costumes dos fiorentinos, é melhor optar por outro mercado, aqui só se encontram turistas. 

 Praia da Vitória, Portugal

Este mercado é completamente diferente de todos os anteriores, é apenas um simples mercado municipal, pouco frequentado e com poucas lojas. Na verdade, na altura em que residi paredes meias com este sítio, existia apenas um talho, uma peixaria, um café, uma mercearia e pouco mais. Poderia ser um óptimo local para conhecer os hábitos e costumes dos praienses, não fossem eles preferir o supermercado do Continente lá da terra.

No fundo pouco interessa quem frequenta os mercados ou de como eles funcionam, é importante que continuem a existir e com vida.





sábado, março 21, 2015

Num destes fins-de-semana fui à cidade da Guarda, o melhor local para se ir no inverno, já que é a cidade mais alta de Portugal bem perto da gélida a Serra da Estrela.
Os objetivos foram claramente cumpridos. Fazer uma bela viagem de comboio para acalmar o vício, conhecer uma bela cidade e comer boa comida. 
No entanto, quando ia caminho da torre de menagem, reparei em algo estranho no cemitério. Um enorme mausoléu sobressaia entre campas e jazigos.
Foi mais forte do que eu, após visitar a torre, ver a bela paisagem da serra pintada de branco, contar aerogeradores em redor, tirar fotos ao casario de pedra, às muralhas do castelo e à grandiosa sé da cidade, fui ao cemitério.
Não se via vivalma, apesar de a manhã estar soalheira, talvez por culpa do vento gélido que se sentia pouco convidativo para grandes passeios. Bem no meio, lá estava o obelisco gigante, uma pirâmide autêntica transladada de Guizé. Exagero um pouco, o túmulo não era assim tão grande!

Não restam dúvidas, estava perante alguém da maçonaria, Francisco de Vasconcellos Sobral.
Na porta podia-se ler a seguinte inscrição:
“Ao Benemérito Medico Francisco de Vasconcellos Sobral, 1845-1888. Os seus amigos. Por subscrição pública por todo o país. “
Como pude investigar posteriormente, Francisco Sobral foi efetivamente um médico, mais precisamente cirurgião do exército (como se pode reparar no retrato por cima da entrada), que apesar de ser natural do Lisboa era muito estimado pela população da Guarda, pertencendo a vários clubes sociais e à maçonaria, e pelo povo da vila de Manteigas, onde foi voluntário durante um surto de tifo.
Faleceu com apenas 43 anos, após cometer suicídio, aparentemente por motivos sentimentais. Esta efeméride apanhou toda a população de surpresa, mobilizando-se tendo realizado uma coleta nacional de modo a recolher dinheiro para a construção desta sepultura, construída apenas alguns anos mais tarde.
Francisco Sobral teve efetivamente direito a uma rua e um largo.
O tempo foi passando e este homem caiu em esquecimento. O largo mudou de nome e a rua nem placa toponímica possui, sendo mais conhecida como rua do cemitério.
A poucos metros, mesmo na entrada do cemitério repousa Augusto Gil, confesso que não sabia quem era mas após uma pequena busca aqui vai o seu poema mais conhecido:
Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim.~

É talvez a ventania:
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho…

Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.

Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria…
 Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!

Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho…

Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança…

E descalcinhos, doridos…
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!…

Que quem já é pecador
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!…
Porque padecem assim?!…

E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na Natureza
e cai no meu coração.
Augusto Gil
Ao contrário do seu criador, a obra é imortal